A Igreja e o “Mundo Jurídico”

“Bem aventurados os que observam o direito, que praticam a justiça em todos os tempos”. Salmo 106:3

Vivemos em um país, cujos governantes e líderes políticos, principalmente em tempos de eleição, empunham a bandeira de um estado democrático de direito, modestamente, somos da opinião de que para se chegar lá e vivê-lo plenamente, ainda ha muito a percorrer.

O estado, em vista do princípio da laicidade, resguardou a igreja, conforme vemos no art. 5º, inciso VI da CF/88 afirmando ser inviolável a liberdade de consciência religiosa, assegurando ainda o livre exercício de cultos religiosos e proteção aos locais de culto e suas liturgias.

Avançando ainda mais, garantiu imunidade tributária aos templos de qualquer culto, conforme o artigo 150, inciso VI, letra b, onde proíbe a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios de instituir impostos sobre os Templos de Qualquer Culto.

Para por ai, daqui em diante só temos obrigações e responsabilidades, por isso esse nosso artigo com o objetivo de alertar as lideranças eclesiásticas neste sentido.

O fato é que muitas vezes, por falta de informação objetiva e por acharem que a instituição que denominamos “igreja” tem um caráter apenas espiritual não existindo de fato para o mundo jurídico, isenta de inscrição no CNPJ, alvará da prefeitura, corpo de bombeiros, controles financeiros e prestação de contas e isso não condiz com a realidade e infelizmente, pouca gente sabe disso.

Estabelece o Código Civil Brasileiro, no artigo 44, inciso VI que as igrejas, de qualquer culto, são pessoas jurídicas de direito privado e que para serem reconhecidas, para que existam no mundo jurídico, necessitam, obrigatoriamente, de registro na Cartório da Pessoa Jurídica.

O Que Deve Ser Registrado no Cartório?

A igreja deve elaborar o seu estatuto e registrá-lo em cartório, deve também registrar a ata da eleição e posse da primeira diretoria, para que sejam identificados os responsáveis pela entidade.

Depois do registro em cartório a igreja deve providenciar a inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) junto a Receita Federal do Brasil.

Após obter o seu registro junto a Receita Federal, deve obter Alvará de Localização e Funcionamento junto a prefeitura do município onde está sediada, neste caso poderá também ser solicitado alvará do Corpo de Bombeiros.

A partir daqui, apta a funcionar, a igreja “adquire” algumas obrigações, a saber:

  • Entregar a SEFIP a CEF;
  • Entregar a DCTF a Receita Federal;
  • Entregar a EFD-Contribuições, se for o caso
  • Entregar o CAGED ao MTB,
  • Entregar a RAIS ao MTB;
  • Entregar a ECF;
  • Entregar a ECD, se for o caso;
  • Entregar a DIRF;
  • Reter contribuição previdenciária na contratação de funcionários e autônomos;
  • Reter imposto de renda na fonte de funcionários, autônomos e ministros;
  • Manter a contabilidade em dia;
  • Escriturar e registrar em cartório os livros obrigatórios.

Todas as atividades de gestão e administração que são levadas a efeito dentro das igrejas devem seguir rigorosamente o que está estipulado em seus estatutos, entretanto, a igreja na condição de pessoa jurídica de direito privado, deve cuidar para que seus atos não extrapole o estritamente legal, visto que ela e sua diretoria respondem, inclusive na esfera judicial pelos danos eventualmente causados a seus membros ou a terceiros, independentemente de culpa ou dolo.

No intuito de restabelecer o equilíbrio das relações sociais, se provocado, o Poder Judiciário pode intervir a fim de coibir excessos e abusos, mesmo em se tratando de Organizações Religiosas, desta forma faz-se necessário o cuidado apurado em algumas questões que elencamos abaixo:

  • Trato com menores (quórum, disciplina, documentação, autorização dos pais);
  • Medidas disciplinares aplicadas a membresia;
  • Estatuto mal organizado (admissão, casamentos, expulsão de membros) ;
  • Desvio de finalidade de dízimos e ofertas;
  • Furto de veículos em estacionamentos da igreja;
  • Bazares e cantinas nos domínios da igreja; (cdc)
  • Viagens promovidas pela igreja (acidentes, prejuízos, cancelamentos);
  • Mutirões para Construção;
  • Contingências Trabalhistas (falta de registro de funcionários, etc);
  • Acidentes com membros e visitantes dentro da igreja.

A igreja também deve ter especial cuidado no trato com voluntários, existe uma legislação específica que trata deste assunto, para saber mais sobre este tema veja esse nosso artigo Artigo sobre folha de pagamento .

O papel da igreja é formar bons cristãos, mas deve também considerar a ideia de formar bons cidadãos, pessoas conscientes de seus deveres e obrigações não só para o mundo espiritual mas também aptos a viver em comunidade e contribuir para o seu desenvolvimento.

O que queremos transmitir é a ideia de que o estado não pode interferir na gestão destas instituições, não pode lhe impor nenhum obstáculo ao seu funcionamento, de modo que elas  não dependem de autorização do estado para cumprir a sua missão institucional e somente por seus próprios mecanismos internos de deliberação pode decidir pela suspensão de suas atividades.

Entretanto, essa liberdade de culto e de opção religiosa não deve ser confundida com qualquer outro tipo de liberdade, a igreja a partir de sua criação com o registro em cartório e obtenção do seu CNPJ junto a Receita Federal ganha o status de pessoa jurídica tendo a liberdade para funcionar, abrir suas portas e cumprir a sua missão institucional, advindo dai também as suas obrigações e responsabilidades conforme elencamos acima.

Enquanto são classificadas como Organizações Religiosas, é preciso e diríamos até imperioso levar ao pé da letra esse termo, devem buscar recursos, reunir pessoal qualificado, enfim se dedicar ao máximo para, de fato, serem ORGANIZADAS.

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